"Paradoxos à parte, ontem meu coturno morreu, coitado. Depois de dezesseis anos de muito barro, cerveja e shows, o véio não aguentou e entregou os pontos, literalmente - a sola se abriu como uma bocarra de jacaré, um dos lados do cano rasgou-se em mais ou menos um palmo de extensão, fora os buracos espalhados. Quando reparei que tinha rasgado, já indo abrindo a boca pra xingar, quando pensei: "Peraí, tenho essa merda desde meus treze anos! Já tava passando da hora de rasgar!"
É com essa constatação que me veio à cabeça outra forma de pensar, de levar e de agir. Tem coisas que arrastamos conosco durante um tempo enorme, senão por toda nossa vida, das quais não nos damos conta que já tiveram seu tempo, que está na hora de deixarmos tais coisas irem embora. É inevitável, tudo vai ter que acabar. Tudo tem que ser acabado. E acho que mais importante, temos que aprender a acabar com as coisas, a reconhecer os prazos de validade, a ignorar os laços sentimentais, às vezes fruto da convivência, que nos atam a peças que já perderam seu valor. É hora de andar. Buscar o novo, o desacostumado e o ainda estranho a nós mesmos. Hora de encontrar algo que nos deixe intrigado com suas manias e trejeitos. Alguém que nos deixe curioso e inquieto, em busca de mais detalhes explicativos de seu funcionamento.
Busca-se laços, às vezes à força, nos enlaçamos sem saber ou querer. Laços, voltas, tranças e nós, daquele tipo que apertamos forte pra ter certeza que não vai soltar. Nos embaraçamos mais e mais, indiferentes aos avisos e sinais cegos à razão e felizes pelo fazer, pelo ser, pelo existir. Ansiosos por sentir, nos enredamos em cordas e barbantes, qual um filhote de gato e seu novelo de lã, absortos no deleite, hipnotizados pela insistência em nos confundirmos ainda mais num redemoinho de fios à nossa volta."
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